Monday, January 29, 2024
ESPIRITUALIDADE E RELIGIÃO NADA TÊM EM COMUM !
A Igreja Católica Apostólica Romana foi convidada —ao menos é o que se diz, embora deva ter havido alguma maquinação entre as autoridades romanas e os novos cortesãos— para a Corte romana prometendo cuidar da alma do ser humano e dos pobres. Mas tanto ela quanto as demais religiões reformadoras que dela derivaram mil anos depois, embora apresentem-se como a verdade natural e como a espiritualidade do ser humano, são de fato dogmas de fé, ou seja, prisões de almas. Em vez de explicarem a evolução e trabalharem a favor das características naturais do ser humano, apenas impuseram dogmas de fé e um código disciplinar que trouxe para os humanos muitas limitações, proibições, culpas, pagamentos de dívidas psicológicas alheias e punições em nome de uma ficção chamada Deus, que representa os donos-do-mundo.
O
rio corre pelo chão,
Quando
esquenta, vira vapor, sobe pro céu,
No
céu, esfria de novo e despenca feito chuva.
Não
há ninguém lá em cima que mande chover ou fazer sol.
O
vapor esfria, vira água de novo e cai de volta no chão. (bis)
A
chuva é o mar, é o rio que evapora,
Mas
parece, não é?, que é o céu que chora.
Se
vivemos enganados há tanto tempo, deixo uma deixa:
Espiritualidade é uma
sensação, um sentimento, uma relação pessoal, grupal, sensorial ou racional ou
ambas, meditativa, contemplativa, consciente, inconsciente, de identidade,
semelhança, afinidade, parceria, alegria, admiração, estranheza, esquisitice, dúvida,
repulsa, antagonismo, tristeza, medo, horror e tantas outras sensações em
relação a outra pessoa, grupo de pessoas, a um ou vários animais, às partes do
corpo de uma ou muitas pessoas, vegetais, com os momentos especiais da vida, as
recordações, os eventos da natureza como o ar, a brisa, a ventania, a neve, a
nevasca, a gota, a água, o rio, o riacho, o oceano, a cachoeira, o pingo de
chuva, o chuvisco, a garoa, o temporal, a moita, o capim, a relva, o mato, o
matagal, as folhas, as folhas secas, as estações do ano, a flor, a árvore, o
tronco, os galhos, o sol, o céu, a lua, o luar, um lugar, uma cidade, uma
saudade, um canto, uma rua, uma esquina da cidade, uma marquise, uma calçada,
um cartaz, uma fotografia, o calor, o frio, a dor, a morte, a vida, a cor,
qualquer fato, as cores e tantos outros seres e fenômenos da natureza e todas
as suas imagens e sons.
No plano físico,
neurológico, cada sensação dessas causa em cada ser humano, dependendo da
história e do trajeto cultural de cada um, uma específica reação química que
estabelece nosso estado de humor: o que sente nosso corpo, bem estar ou mal
estar, um estado definido ou indefinido, seguro ou inseguro, alegria e atração
ou dor e repulsa.
Assim o primitivo se
relacionava com a natureza.
Admirava o sol e a água
mansos que fazem germinar no solo as sementes, as plantas, o fruto, o alimento,
e dava-lhes oferendas de agradecimento. Temia o sol e a água bravos que
ressecam, inundam e matam o solo, e fazia-lhe oferendas de súplica. E assim por
diante.
E suplicavam também com
palavras. Os pedidos espontâneos ao vento, ao sol, à lua, às tempestades, e aos
demais fenômenos da Natureza, a Igreja Católica escondeu, apropriou-se deles, tornou-os obrigatórios com
os nomes “prece”, “oração” ou “reza”, como
se fossem inédita exclusividade de seu convenientemente inventado Deus.
Para tentar explicar o
que não sabe, o ser humano cria seres e coisas à sua imagem e a serviço de sua
necessidade, e assim inventou que cada fenômeno natural era enviado por uma
divindade; muitos eram os fenômenos, muitas eram as divindades, de todos os
sexos. O ser humano vivia em tribos, todos os adultos relacionavam-se
sexualmente entre si, todos os sexos considerados.
Desta dualidade de um
mesmo fenômeno da Natureza —a chuva, por exemplo, dependendo da intensidade,
fertiliza e destrói— a Igreja Católica
inventou o aterrorizante Bem e Mal.
Longe dali as tribos
vieram prolifererando, a proliferação expandiu os territórios ocupados, a
expansão trouxe a separação de pessoas e recursos; a separação começou a
dividir as tribos em famílias. O maior distanciamento exigiu a subdivisão e
coordenação dos estoques que precisavam estar à disposição; a subdivisão exigiu
a coordenação entre os estoques parciais. A coordenação dos estoques começou a
dar origem ao Estado.
Os estoques separados exigiram a
responsabilização de pessoas para geri-los; os responsáveis eram escolhidos
segundo sua competência e experiência. Os estoques foram se particularizando
naturalmente.
A população e os territórios continuaram expandindo; a distância cada vez maior entre os responsáveis pelos recursos e suas porções da tribo foi exigindo deles decisões cada vez mais pessoais; a distância dos demais responsáveis dificultava e impedia a decisão em consenso. Cada responsável começou a ter que decidir sozinho, o responsável isolado era o curador dos recursos sob sua responsabilidade. Começava a nascer a propriedade privada.
Há pouco mais de dois
mil anos surgiu em Jesusalém, na Palestina, então ocupada pelo Estado de Roma,
um grupo de pessoas que percebeu e deu especial atenção à existência de pessoas
pobres e à desatenção com que eram tratadas. O líder se chamava Jesus Cristo, o
grupo tinha uns doze membros.
Havia na cidade outro
movimento de resistência na época, os zelotes, palestinos que conspiravam para
retomar o poder aos romanos através da luta armada. Sondado por eles para
ingressar no grupo, Cristo recusara-se a aderir alegando que seu movimento não
era armado, “não era desse mundo”.
Na época não existia “economia”
como objeto de estudo. Sabia-se apenas da atuação dos seres humanos em relação
aos outros seres humanos.
Para Cristo, a maneira
de dar a apregoada atenção aos pobres era pedir que os ricos do lugar fossem
generosos, distribuissem suas riquezas, e atentassem para os problemas de saúde
dos pobres. Seu movimento era idealizado —e o Cristianismo assim é até hoje—
baseado na sua capacidade pessoal de observar e pensar sobre as deficiências e
insuficiências da sociedade que presenciava e na qual vivia. Deve ele ter
pensado, como muitos, que os seres humanos eram todos iguais, e que a
intelectualidade dele, Cristo, era comum a todos. Como o materialismo dialético
de Marx ainda não existia, não fazia ele idéia que o móvel do ser humano é a
necessidade, não os ideais — os ideais podem até existir, mas, se não
corresponderem a necessidades objetivas, serão sobrepostos, não irão adiante.
Os seres humanos vivem o instinto de sobrevivência, acomodam-se na estrutura
que lhes é oferecida para viver; se têm ideais, estes limitam-se, por
necessidade de firmar-se e ascender socialmente, a destacar-se no interior da
sociedade dominante.
Se Cristo, indivíduo
inteligente, talvez (em relação à Antiguidade) pioneiro na atenção aos pobres,
conhecesse Marx, hoje nosso pé no chão, sem dúvida a humanidade teria se
beneficiado muito já a dois mil anos atrás.
Mas os ensinamentos
gregos especulavam sobre a existência de um espaço supraterreno, onde haveria
um deus-criador, e o judaísmo, que também se baseava em um deus único,
profetizara para a época o nascimento de um “novo Messias”, etiqueta atribuída
a Cristo e renovada em suas andanças e conversas precoces. Mais adiante na
vida, aos 33 anos, quando já seguia avançado o movimento hoje conhecido como
Cristianismo, ele, Cristo, confuso quanto a sua possível ligação com o
deus-criador, foi meditar no deserto a ver se lograva algum contato com seu
deus-pai. Talvez influenciado por esse estado mental místico e misticista e
pela tradição idealizadora judaica, que criara, vivia e professava uma visão
mística do destino do povo judeu, Cristo criou para si mesmo uma idealização e
dali em diante passou a denominar-se “o filho de deus feito homem”.
A visão mística do
próprio destino deve ter sido uma habitual decisão política necessária ao povo
judeu, que, depois de expulso de sua terra natal, nunca mais voltara a viver
nela ou noutra que viesse a chamar de sua. O povo judeu sempre vivera, e
viveria no futuro, em nações alheias; para manter-se unido, portanto, era
preciso muita tenacidade e coesão. A atuação dos judeus, cujo judaísmo não
acreditava em anjos, ressurreição dos corpos, imortalidade da alma e tais bobas,
mas convenientes, fantasias católicas, é portanto política, cuja plataforma
tinha a missão nuclear de unir todos os seres humanos e conduzi-los,
oferecendo-se como exemplo, a essa união.
Mas o Cristianismo teve
contestadores entre seus apóstolos: uma coisa era liderar um movimento em prol
dos pobres, outra, um absurdo, era chamar-se filho de deus.
Ao ouvirem falar do tal
reino dos céus, onde reinava outro rei que não um romano, os romanos
sentiram-se ameaçados e foram tomar satisfações aos judeus. Em vez de explicar
que seu movimento era místico, coisa da alma humana, Cristo, provavelmente por
ter confundido sua catarse com a realidade, insistiu na existência do reino dos
céus e por isso, por iniciativa dos romanos, foi condenado pela casta rica dos
judeus, os saduceus, para não porem em risco os bons negócios da elite judaica
com seus senhores romanos [A eterna cumplicidade entre o colonizador e a
burguesia dominante de um país.] . Os judeus não tinham a crucificação em seu
cardápio de execuções, Cristo foi crucificado pelos romanos.
O Cristianismo
expandiu-se na região. Por volta do ano 400 d.C., Roma estava falida e endividada.
Os campos não produziam, os camponeses reivindicavam junto às autoridades
romanas, em nome de suas muitas divindades, o atendimento de suas necessidades.
A nova religião apresentava a conveniência de oferecer uma única explicação para a origem do mundo, criado por um único deus que exigia “ser amado sobre todas as coisas” (uma cláusula tácita exigia também o temor a Deus) e, ainda por cima, que seus fiéis renunciassem aos bens terrenos para merecer a vida eterna no paraíso. Para Roma aquela era a solução para todos os seus problemas, e o Estado Romano não hesitou em institui-la como religião oficial.
Vamos lembrar mais uma vez que também no Egito Antigo, em ca. de 1580 aC, com o mesmo objetivo político, Amenófis IV também promoveu a unificação de todos os deuses, unificação representada pelo disco solar – Aton.
A nova religião, tendo
descartado toda a evolução do ser humano, que na época sequer era objeto de
estudo, desconsiderando as características naturais do ser humano inventou Deus
e o impôs à humanidade como criador do firmamento e da natureza. E um homem e uma mulher, um casal, como origem do
ser humano. E impôs um código de conduta, um conjunto de dogmas de fé que, se
desobedecidos, seriam considerados “pecados” e, como tal, punidos. Quando a
nova religião passou a oficial, os “pecados” dos fiéis passaram a ser crimes
contra o Estado.
Pecados eram as
transgressões ao código de conduta religioso, que eram punidas com castigo
físico, prisão e morte. Dessa punição, mais especificamente do medo de ser
punido, nasceram todos os preconceitos ainda hoje vigentes no comportamento do
ser humano.
A punição individual é
marca de nosso sistema judiciário contemporâneo. Como tudo o mais na ideologia
dominante, é uma máscara que faz grande alarde mas não conduz à causa e muito
menos à solução dos problemas, máscara que têm origem de fato na escassez
disputada pela enorme maioria dos seres humanos, porque a fartura pertence a um
miúdo punhado deles. Punindo o indivíduo, a sociedade dá o problema por
encerrado; o indivíduo é preso, mas a estrutura da sociedade não é atacada, o
problema não é sequer abordado, e muito menos solucionado.
A logomarca do
Cristianismo seguiu sendo divulgada: a imagem de Cristo exausto carregando a
cruz, filetes de sangue escorrendo no rosto mostrando dor, uma coroa de
espinhos na cabeça, apanhando dos soldados romanos e dos circunstantes que o
acompanhavam recriminando e zombando de sua pretensão de ser rei. E o retrato
de Cristo impresso em sangue num pano.
Ele não renegara o
reino dos céus, não abrira mão de ser o filho de deus, e, como Roma não admitia a existência de outro
rei, foi condenado e crucificado. Para nos salvar, impôs a Igreja Católica
Apostólica Romana. Nos salvar por quê? Porque, se tivesse negado “seu” reino do
céu, o ser humano devoto e obediente não teria para onde ir após a morte, outra
ficção —a vida eterna, um prêmio de
compensação para todo aquele que obedecesse aos mandamentos— que
jamais existiria, e a Igreja Católica tampouco prosseguiria.
A Igreja Católica
Apostólica Romana acabava de aplicar o primeiro “conto do vigário na humanidade
da época, que dali em diante aplicaria em todo ser. Sim, porque, a bem da
verdade, seus papas, cardeais, bispos, padres, sacristãos e prepostos são, com
suas roupas exóticas e sofisticadas, meros vendedores de um “Plano Moradia no Aém”.
A Igreja Católica sagrou-se “o grande espertalhão” de nossa civilização, porque
é hoje, século 21, nada mais nada menos, a maior proprietária de imóveis neste
nosso planeta — imóveis terrenos, precisamente aqueles aos quais ela exige que
seus fiéis renunciem.
Segundo sua própria
doutrina, entretanto, se renunciar aos bens terrenos era necessário para ter
acesso à vida eterna no Céu, ela própria, a Igreja Católica... iria para o
Inferno?
Iniciava-se a “Era do
Espertalho”, como já dito na Contradição 11.
De seu objetivo
original, dar atenção aos pobres, oficializado por Roma e continuado com o nome
de Igreja Católica Apostólica Romana, restou para os pobres apenas a esperança
de redenção do sofrimento renunciando aos bens terrenos em vida e pagando os
pecados do mundo para auferir a vida eterna após a morte. De concreto, porém,
além de muita reza[1],
a Igreja Católica —nem as reformas protestantes mais tarde— fez e faz pouquíssimo pelos pobres e enfermos
proporcionalmente ao imenso e crescente quorum de pobres no mundo e ao imenso
patrimônio imobiliário e fundiário que ela capitalizou.
Por quê a igreja não
cumpriu seu objetivo original? Muito simples: porque ela agiu como de fato era,
uma empresa dona de latifúndios, feudos concedidos pelas cortes. Tornara-se
cortesã, elite dominante, a partir do instante em que fora adotada por Roma
como religião oficial. Os fundos que arrecadou até começar a emprestar a juros
altos para os castelos e enriquecer definitivamente, financiando as guerras
feudais de retaliação e de conquistas territoriais, provem da renda de suas
terras arrendadas a colonos a altíssimas taxas, do dízimo cobrado a todos os
católicos, da venda de indulgências a soberanos, nobres, ricos mercadores e a
qualquer um que por elas pagasse vultosa quantia e das famílias dos papas, que
eram riquíssimas. Papas, cardeais e bispos frequentavam os castelos, eram
membros assíduos das cortes e participavam de suas decisões políticas, mandando
e desmandando.
As religiões enganam o
ser humano quando se autoproclamam ser a espiritualidade do ser. Suas
proibições são dogmas de fé, mera repressão às características naturais do ser
humano, são um reles código de conduta, uma adequação às determinações dos
organizadores do mundo, homens ricos, estabelecidos no mundo, e superiores
hierárquicos. Causam ao vivente danos tão irreversíveis —como as carências de
afirmação decorrentes do culto cada vez mais forte ao individualismo necessário
à manutenção do capitalismo, à obediência e culto ao modelo de indivíduo rico e
poderoso— que foi preciso inventar uma ciência, a Psicologia, para tentar
desemaranhar as neuroses humanas que foram aumentando na proporção direta do
aumento do aperto nas cidades e da impossibilidade de as determinações civis e
eclesiásticas serem cumpridas na prática da vida... Porque a realidade humana
não se motiva em idealizações —apesar da propagada insistir nelas para desviar
o ser humano da razão e deixá-lo à deriva das manobras dominantes— mas na mobilização
para satisfazer as necessidades.
Antônio Maria e Fernando Lobo descreveram com maestria, na canção “Ninguém me ama”, essa carência do ser humano que se identifica com os valores dominantes.
"Ninguém me
ama, ninguém me quer, ninguém me chama de “meu amor”.
A vida passa, e
eu sem ninguém, e quem me abraça não me quer bem.
Vim pela noite
tão longa de fracasso em fracasso,
E hoje descrente
de tudo me resta o cansaço,
Cansaço da vida, cansaço de mim, velhice chegando,
E eu chegando ao fim."
As
igrejas são empresas privadas, e por isso dão amparo e refúgio à ampla e
irrestrita atuação da ideologia dominante capitalista. A Igreja Católica
Apostólica Romana foi e é, como já dito, a maior empresa imobiliária do mundo,
motivo por que, também contra os partidários da propriedade coletiva dos meios
de produção, os comunistas, ela criou um preconceito específico, acusando-os de
“não terem Deus nem amor no coração”.
E são sempre
oportunistas. Recentemente, em 2015, quando o Estados Unidos, depois de mais de
50 anos de bloqueio econômico contra Cuba, reatou relações comerciais e civis
com a ilha, a Igreja Católica tratou de ir lá às pressas, em viagem
notoriamente autopromocional, para não perder seu “mercado”, o “povo pobre” do
lugar, objetivo social que lhe rende isenção de todos os impostos, fartos
donativos do setor privado e perpétua capitalização, em troca de umas obrinhas
sociais, umas migalhas para os pobres.
1 Há um
país na África, não me lembro qual, que, nos momentos de dificuldades, em
vez em rezar manda matar passarinhos.
Assim, para resolver nossos problemas, em oposição a pensar em conjunto temos
duas outras possibilidades, rezar e matar passarinhos.
ALGUMAS CONTRADIÇÕES DE NOSSA CIVILIZAÇÃO
José Eduardo Ribeiro Moretzsohn
Sigmund Freud: “As massas nunca tiveram sede de verdade. Elas querem ilusões e não vivem sem elas. Amiúde dão ao irreal a precedência sobre o que é real. São influenciadas pela mentira quase tão intensamente quanto pelo que é verdade. Têm uma evidente tendência a não distinguir entre as duas.”
O Pato Selvagem, Henrik Ibsen: “...se você tirar a mentira vital de um homem comum, tira-lhe ao mesmo tempo a felicidade”; “se retirar a mentira da vida de um homem, condena-o ao sofrimento.” 5
Os Espectros, Henrik Ibsen: “...Eu queria apenas desfazer um nó, mas, quando consegui, vi toda a minha história desatar entre minhas mãos, mesmo ela tendo sido, como percebi então, costurada à máquina.” 6
Considerações sobre a França, Joseph de Maître (a propósito da Revolução Francesa): “Deus puniria os revolucionários franceses e faria a “exaltação do cristianismo e da monarquia”.
CONTRADIÇÃO 01: As massas não têm sede de verdade porque não tem tempo para pensar e, sobretudo, porque tudo o que a ideologia dominante lhes diz, com o apoio das igrejas, sobretudo da Igreja Católica Apostólica Romana, diz como se fosse a verdade natural —não circunstancial— do ser humano.
CONTRADIÇÃO
02: fartura x escassez — A medida do
êxito é a fartura, mas a regra que baliza a sobrevivência é a escassez, muitos
competindo para, portanto, possuirem pequeninas porções dela e poderem ser
reconhecidos como aptos a continuarem vivos. (O mérito está em quem ganha mais,
compra mais e tem mais, portanto na fartura monetária e patrimonial, mas a premissa
básica do jogo, que promove a competição individual, é a escassez.). Todas as
pessoas são enganosamente estimuladas a atingir a fartura, mas, mesmo as que
logram êxito e conquistam uma situação econômica mais abastada e algum
patrimônio —um lugarzinho na escassez que disputam—, só se destacam de seus
iguais no plano da escassez, isto é, serão muito menos escassas que os demais.
A fartura, embora esteja concentrada nas
mãos de uma meia-dúzia de indivíduos, é alardeada pela propagada como se houvesse
uma para cada indivíduo. Mas a natureza é uma só; já foi de todos, mas com o
tempo sua imensa maior parte foi sendo apropriada por uma meia-dúzia de
indivíduos.
Assim diz o patrono: “Eu,
dono de 80% de tudo o que há no mundo e vivo na fartura, imponho a esta
civilização regras de conduta que vocês, 80% da população deste mesmo mundo,
devem obedecer para terem direito a disputar os 20% que lhes restam e um dia
poderem ser iguais a mim. Pois para estarem de bem comigo, precisam querer o mesmo
que eu quero, precisam querer ser no mínimo iguais a mim.
Mas o que não vou lhes
dizer é, se o que lhes resta é disputar um lugar na escassez, impossível será
me alcançarem na fartura, onde cabe cada vez mais menos gente!”
O dono das coisas
também é cristão, muçulmano, crente e espírita. Também ele abdica de muitas
características naturais do ser humano em prol da eficiência e expansão do
capital. A única diferença entre ele e o despossuído é que ele tem a
compensação de viver na fartura,
comprando, comendo e usando tudo do bom e do melhor, enquanto o despossuído, a
grande maioria do mundo, permanece disputando a escassez para alcançar no fim
do mundo —diz a propaganda das religiões a serviço dos dominantes— a
compensação máxima e derradeira, o grande barato, o “grand finale”: a vida
eterna no paraíso (os que conseguirem o “nada consta” dos Dez Mandamentos).
Enquanto nossa vez não chega, as religiões vão nos enganando com frases simpáticas como “Deus escreve certo por linhas tortas.“, mas “Quem ri por último ri melhor!” e, acima de tudo, “A voz do povo é a voz de Deus!”.
A quem nada tem resta
extrair do mínimo o máximo, assim gerando o processo comumente chamado de
“vida” que, despertando e fomentando sentimentos positivos, institui em todos a
opção do prazer, alegria e lazer e nos conduz a uma conclusão simples: a necessidade
de acumular e contar dinheiro é exclusividade dos capitalistas.
Ou todos os habitantes vivem em fartura ou viver na Terra continuará cada vez mais inviável.
CONTRADIÇÃO
03: capitalismo = genocídio + homicídio + suicídio. O capitalismo é genocida...
dizima povos inteiros — nas guerras, nos regimes autoritários; é homicida: mata
homens; os seres humanos matam-se entre si para disputarem, entre os poderosos,
a supremacia e, entre os despossuídos, um lugar no chão; é suicida: incapaz de
prever a evolução das invenções e iniciativas da livre empresa senão através de
suas consequências, a prática da expansão destrói o planeta, habitat de todos
os seres humanos; quem destrói sua casa extermina-se a si mesmo.
Só
conseguem chegar ao bico do funil e lograr um posto de trabalho no sistema
produtivo os humanos que reproduzem o sistema que destrói suas próprias vidas.
O
moto contínuo é conveniente: quanto mais obedientes à ideologia dominante em
nossos atos diários da sobrevivência, mais a reproduzimos, mais cúmplices
seremos das sequelas do código de conduta original e portanto de nossa própria
destruição.
Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. Como a grande maioria dos humanos não tem tempo sequer de pensar numa solução definitiva, e por isso só faz reclamar o tempo todo do “contrato de adesão” que assinou involuntária e tacitamente com a sociedade ao nascer e ser registrado num cartório civil —ou mesmo sem registrar—, entram em modo de cumplicidade com esse genocídio e homicídio sociais e num estado de “suicídio culposo” porque sabe que nada pode fazer contra sua própria destruição mas sabe —porque sente na pele— que está sendo destruído. Os que galgam a escala social e encostam como prepostos na casta superior, só tardiamente começam a perceber a arapuca em que se meteram. A única diferença entre a massa inconsciente e os que tem consciência política é que estes têm consciência de seus estados de “homicídio, genocídio, suicídio e suicídio culposo”.
Essa estória de pedir aos empresários um tratamento justo aos
trabalhadores e a todos os seres humanos é um gigantesco e estéril eufemismo.
Como se pode pedir aos donos
do mundo —o conjunto de bancos, indústrias e fazendas agrícolas— um tratamento
justo aos trabalhadores e a todos seres humanos, se eles sequer consideram o
dano que estão causando a si mesmos ao praticarem em suas indústrias e
plantações processos de produção, todos, que destróem o solo, subsolo, águas,
florestas e atmosfera, e se, se assim agindo, não se preocupam em destruir a
casa —o planeta— em que também eles, assim como todos nós, habitam? E se, por
destruírem a própria casa, a casa que também eles moram, são suicidas
inconscientes? E se, neste caminho suicida inconsciente, vão destruindo tudo e
todos?
Não se pode esperar nada dos
donos do mundo. Por essa ignorância, incompetência administrativa e
displicência, só nos resta a todos, a imensa maioria dos habitantes da terra,
insistir e alardear que eles, os donos do mundo, não podem ser caciques deste
ou de qualquer outro planeta em todas as galáxias —nem mesmo de anéis,
meteoritos e satélites.
Sobretudo se considerarmos que cientistas, técnicos especializados e práticos já produziram conhecimento suficiente, e que já existem administradores especializados e competentes, capazes de administrar o planeta de uma maneira que o permita restabelecer e dali em diante viver com saúde.
CONTRADIÇÃO 04: Tamanho não é documento! Sem a faculdade de inventar, o ser humano não teria sobrevivido na natureza. O que o manteve e mantém vivo é sua faculdade de inventar tecnologias medicinais e medicações, porque, sem elas, ele já teria sido exterminado por seres minúsculos, muitíssimo menores do que ele, os insetos, e por outros invisíveis até, os micróbios e as bactérias. Como custa caro sobreviver!
CONTRADIÇÃO
05: “Se piorar, melhora” ou “quanto pior, melhor”. O Produto Interno Bruto
(PIB) de um país aumenta (a) quanto mais se estraga a natureza, pois novos
serviços de reparos ecológicos são criados e contratados para tentar
consertá-la, expandindo a contratação e os decorrentes ganhos do trabalho; (b)
quanto mais aumenta a violência, pois novos armamentos são fabricados e novos
policiais são contratados; (c) quanto mais a medicina, através de seus cientistas
e laboratórios, investe em prevenção e cura das doenças humanas, animais e
vegetais. Isto é, quanto mais doenças, mais o PIB cresce.
O investimento em saúde
da população visa a manter estável a quantidade de mão-de-obra não-qualificada
produtiva, para não ocorrer o mesmo que ocorreu quando a Peste Negra abateu-se
sobre a Europa no século XIV, matando mais em dois anos do que toda a Primeira
Guerra Mundial: morreu tanta gente que a paga dos trabalhadores aumentou 50%.
E uma próxima evolução humana não seria diminuir o cérebro humano, ou eliminar muitos de seus recursos, já que o tão rudimentar raciocínio economicista e militar utiliza apenas 10% de nossa capacidade cerebral?
espírito do PIB x consciência da
natureza
todo poderoso é uma comodidade carente.
nem toda bala é doce.
Nessa mesma linha de
contradição está a violência do quotidiano, a insegurança dos seres humanos, as
desgraças, as tragédias e o sofrimento. Quanto maior a desgraça, a tragédia, o
sofrimento, tanto mais o ser humano não vê sentido em poupar dinheiro, porque,
como “da vida nada se leva”, ele pensa, diante das tragédias, que vale a pena
gastar a poupança para saciar suas necessidades idiossincráticas. Portanto,
quanto mais aumentam as tragédias —desmoronamentos, deslizamentos, chacinas,
inundações, acidentes de trânsito, de trabalho— mais o ser humano consome, para
aproveitar a vida enquanto ainda está vivo. Afinal, a qualquer momento, e sem
aviso prévio, a vítima pode ser ele!
Ou seja, seja construindo ou destruindo, o capitalismo se dá bem!
CONTRADIÇÃO
06: “A voz do povo é a voz de Deus!”.
Fácil, não? O administrador da civilização cria um código de conduta com
valores idealizados para satisfarem a conveniência dos fartos —que tem terras
para plantar, cultivar e colher, animais para ará-las e transportar a colheita,
com ouro e pedras preciosas no subsolo, casas com muitas mulheres e filhos—,
instila esses valores nos humanos dos arredores e nos demais povos
desconhecidos que vão encontrando no caminho quando se expandem além de seu
território original, valores em prol dos quais cobra e exige obediência sob
pena de agressão e punição militar e policial. Essa doutrinação coercitiva dura
gerações, a memória esquece que foi violentada, os povos, que são crédulos,
oprimidos e reprimidos, passam a acreditar e a viver os valores que aprenderam.
Quando os repetem de boa fé, nalgum evento ou disputa, o administrador exulta e
brada a plenos pulmões, sempre amparado pelas religiões, que são seus melhores
capangas, que “a voz do povo é a voz de Deus”.
O ateísmo diz “A religião não dá respostas, impede perguntas.”, e Krishnamurti, quanto aos ideais, diz “Os ideais não tem lugar na educação porque impedem a compreensão do presente. E Paulo Freire disse “Educar não é cortar asas, é orientar o vôo.”, outra frase que, se não conhecêssemos o autor, poderia ser uma “revolucionária” qualquer a serviço de qualquer coisa, pois dita a esmo ficam faltando complementos definidores como “orientar como?” e “para quê”?
Acompanham
“A voz do povo é a voz de Deus.”, sempre no intuito de nos engambelar, e sempre
aplicadas a momentos oportunistas, frases como “Os últimos serão os primeiros.”,
“Quem ri por último ri melhor.”, “Cristo morreu para nos salvar”, “Deus escreve
certo por linhas tortas.”, “O crime não compensa.”, “A justiça tarda mas não
falha.”, “Além de flores, nada mais vai no caixão.”, “Da vida nada se leva.” e “Estamos construindo um país melhor e mais justo.”
Quanto a essa última, vale lembrar que os humanos, nos povos primitivos, já viveram em fartura em terras em que cada uma era de todos e todos eram iguais. A palavra justiça sequer existia. A única diferença de nossa época para aquela, que causa a impressão de que vivemos melhor, são as invenções —ao mesmo tempo funcionais e divertidas— como a roda, o rádio, a televisão, o telefone, o gravador, a fita cassete, o computador, o computador pessoal, o vídeo, o CD e DVD, o telefone celular, o video game e tantas outras, cuja produção, no entanto, ocorre em um regime que produz pobreza para a grande maioria da população.
CONTRADIÇÃO
07: a incapacidade de o homem prever com
ou sem exatidão a longo prazo as consequências de seus atos e invenções. A
débito da expansão dos negócios, as ofertas da natureza e toda descoberta e
novidade são esbanjadas. As consequências, só o tempo diz.
A
própria evolução da humanidade é prova dessa nossa incapacidade de prever a
longo prazo. Em Engels, “Origem da Família, da Propriedade Privada e do
Estado”, vemos que as mutações na organização dos povos, desde a gens até o
casal de duas pessoas e hoje à família de uma pessoa só, foram acontecendo à
medida das necessidades, on demand no jargão atual da
informática. O que existe hoje não foi planejado a priori. A proliferação
humana das gens e a expansão territorial acarretaram mudanças, e os administradores, em cada uma
das várias épocas, foram rearrumando alimentos, materiais e pessoas,
subdividindo-os para adequá-los à nova situação. Não tinham como sequer
imaginar as distorções que foram aos poucos surgindo e que no longo prazo vieram
dar enfim no que temos hoje, uma civilização que é sequela, além da causa
econômica, desta incapacidade de imprevisão: a civilização da cristocapitalose,
que não é um modo de vida, é uma patologia.
Quem diria que a
primeira fumaça expelida pela primeira indústria manufatureira criada na
Inglaterra há uns 200 anos iria furar uma tal “camada de ozônio” que protege a
atmosfera contra os raios ultravioletas do sol?
E as sacolas plásticas,
invenção dessa mesma indústria? Hoje os humanos lutam desesperados para
encontrar uma solução para eliminar um acessório que, quando entrou em vigor,
foi considerado um importantíssimo e indispensável utensílio de apoio às embalagens
industriais e às compras domésticas.
Quem diria, depois de
uns 30 anos de esforços dos vários países para deter e extinguir os gases de
efeito estufa na atmosfera, que os Estados Unidos da América do Norte, o maior
emissor de gases, iria em 2017 se retirar do Acordo de Paris, pacto que firmou
compromissos a médio e longo prazos para a redução continuada desses gases até
sua eliminação? Ou seja, nem mesmo no plano subjetivo se pode confiar sequer
nos combinados!
Se alguém perguntar o
que há de errado no ar, que pareça indecência, pouca vergonha e falta de juízo,
o ar dirá que indecência é invenção da Igreja Católica, dirá que, assim como o
solo e as águas e as matas, também ele está contaminado, envenenado pelos seres
humanos. E por isso seus habitantes —vírus, fungos e bactérias— vão ao chão
buscar alimento picando seus algozes antes que terminem de assar ao calor do
aquecimento do nosso imundo e candente planeta.
E
quem diria que a proliferação da produção de objetos pequenos que exigem a
concentração do nosso olhar à curta distância —como televisores, computadores,
celulares, jogos, etc.— está forçando
nossos olhos, em idade cada vez mais precoce, a fazer o foco cada vez mais
perto e consequentemente desfocando as imagens à longa distância, tendendo a
causar a doença ocular chamada miopia já a partir da tenra idade?
Quem
diria que hoje, 2021, a maior preocupação da Medicina de massas seria a
expansão do diabetes no mundo inteiro, resultado da má alimentação, do consumo
excessivo de açúcar refinado?
O
ser humano consome tanto açúcar, desde embrião e lactente através da mãe, e
durante a infância e adolescência em balas, refrigerantes, bolos, lanches,
sucos, etc., que, quando chega aos 40 anos, o pâncreas, estafado de tanto
trabalhar, começa a produzir pouca insulina, insuficiente para executar sua
tarefa funcional de conduzir o açúcar ingerido para o interior das células do
corpo —que é onde ele deve permanecer— resultando na sua permanência em quantidade
excessiva na corrente sanguínea, que resulta no mau funcionamento do organismo,
numa doença chamada diabetes.
E
consumimos tanta gordura que a vesícula biliar se enche de bolas de gordura e
não produz bile suficiente para o fígado exercer suas funções. E as paredes dos
intestinos ficam tão impregnadas de massa gordurosa que impedem ou no mínimo
dificultam a absorção dos nutrientes por elas para a corrente sanguínea.
Mas,
apesar das tantas doenças, a ciência e a medicina vão inventando reparos para
nosso organismo. Podemos viver com coração, rins, olhos e fígado alheios,
marcapassos, ossos de metal e outros acessórios. O tempo de vida médio da
humanidade aumentou. Vivemos mais tempo, e isto interessa à ideologia
dominante: o ser humano atinge a plena
capacidade operativa em teoria, prática e tarimba aproximadamente aos 40 anos
de idade, quando já dando sinais de cansaço começa a ser substituído por
pessoas mais jovens. Pois o aumento da longevidade, prolongando por muito mais
tempo a força de trabalho humana, vem precisamente aumentar o retorno do
investimento de capital no ser humano, que, embora mais doente, vai render
muito mais tempo para seus empregadores.
Estamos
à deriva das sequelas das invenções do passado e das ainda desconhecidas e
imprevisíveis sequelas das imprevisíveis invenções presentes e futuras.
Aprendemos
que a natureza não pode ser violentada, e a previsão humana não tem antecipação
suficiente para não agredi-la: a agressão não é sentida e avaliada senão depois
que as sequelas aparecem.
O
exemplo mais contundente de nossa imprevisibilidade: ninguém no passado, sequer
por devaneio, imaginou que a água poderia acabar. Hoje, volta-e-meia temos que
economizá-la porque as estias estão secando os reservatórios.
E
o ar? Será que pode acabar? Sim, pode. A poluição é tanta, são tantas as
partículas de sujeira nele contidas que sua utilidade como combustível humano
pode se extinguir. E por isso podemos imaginar, como fim do nosso planeta,
considerando a competição individualista incentivada pela ideologia dominante,
o último ser humano sobrevivente —já que o individualismo tende a um— gritando,
do topo de uma montanha para um vasto vale ao pôr-do-sol, um potente brado de
“Vitória!”, que ele só ouve pelo circuito interno da garganta e das narinas,
porque lá fora não mais existe ar para propagar o som.
Mas...
Um momento! A NASA, antevendo essa possibilidade, pode, a algumas centenas de
anos antes do fim do mundo, enviar centenas ou milhares de astronautas, levando
consigo tanques e mais tanques de ar e água suficientes para muitas décadas ou
séculos, para vários planetas do universo onde tentarão fincar raízes e dar
início a uma nova interação com as desconhecidas matériais locais... e ver no
que dá!
Diante
de tal hipótese, valendo-nos do princípio de que pensar é livre, podemos
imaginar que o mesmo pode ter ocorrido conosco, seres humanos, aqui neste
planeta Terra. Podemos ter sido criados aqui por seres extraterrenos que aqui
desembarcaram —assim como nós humanos fomos à Lua—, podemos ter sido enviados
para cá ou aqui abandonados, vindos de um possível moribundo ou próspero
habitat anterior. Não devemos ter nascido aqui... afinal, somos os únicos seres
neste planeta que predam o ambiente, enquanto todos os demais com ele convivem.
Então, por sermos estranhos aqui, deve ter sido necessário pensar muito para sobreviver, pois não podíamos comer folhas ou animais crus —Já imaginou comer galinhas cruas com penas?— nem fazermos nossos abrigos ou nos defender das feras usando apenas nossas mãos. E esse tanto pensar deve ter aumentado tanto o nosso cérebro e desenvolvido nele tantas complexas relações de raciocínio que nos levaram enfim a destruir também esse nosso novo habitat, e assim por diante... Assim por diante?
CONTRADIÇÃO 08: o preço caro das artes e a falta ao ser humano de tempo livre para pensar é uma garantia “natural” de que os valores do código de conduta não serão contestados, já que uma enorme quantidade de manifestações artísticas —literárias, teatrais, cinematográficas, videográficas, etc.— explica com exatidão o que é necessário saber para se compreender e constatar a inviabilidade de nossa civilização.
CONTRADIÇÃO 09: o maior acionista da maior empresa do mundo também é cristão. Também ele tem consciência de que o mundo é injusto. Mas ele proclama aspirar a um mundo mais justo, que ocorrerá, ele apregoa, quando todos os demais humanos não agraciados com riqueza hereditária tomarem o caminho que ele prescreveu, e enfim se assemelharem a ele. Também ele, por também atrelar-se ao código de conduta, amarga o abandono das muitas características humanas naturais; mas ele, por possuir bens e conforto, pode se dar ao luxo de perdê-las porque terá a compensação de comprar tudo e todos que quiser.
CONTRADIÇÃO
10: o dono das terras manda seu batalhão
exterminar uns estranhos que estão habitando uma clareira na mata, pois precisa
terminar de desmatar o lugar para expandir seus negócios.
— Doutor, não posso fazer o que o senhor me paga para impedir — o soldado alega.
— Ora, ninguém vai saber. Preciso expandir meus negócios. Se você não quiser, mando outro no seu lugar! E você, transfiro para a Conchinchina!
Indo ao encontro dos soldados, o comandante estranha a ordem, pois o regulamento de seu ofício prega que ele deve executar a lei e combater o crime. E vai pensando profundamente enquanto caminha para o mato até que, já bem perto da tropa, seu rosto se ilumina, e ele conclui, resoluto e radiante, e anuncia para alegria de seus comandados:
— Ora, se podemos transgredir o regulamento em benefício de nosso dono, podemos, também nós, transgredi-lo em nosso próprio benefício.
O grupo comemora a descoberta.
O
capital passou a ocupar o lugar das armas na expansão dos territórios; de
artilharia de vanguarda na era medieval, elas passaram para a retaguarda, para apoio
ao capital, que passou a valer-se das mesmas estratégias de expansão dos feudos.
O capital passou a ser a propriedade em si enquanto as terras e imóveis
tornaram-se reles ativos destinados à produção de capital e renda, mantendo o
ciclo contínuo.
Há ca. 100 anos, Lênin disse e escreveu que o imperialismo é o estágio superior do capitalismo. Com respeito e admiração por Lênin, muito antes do capitalismo o imperialismo foi praticado por gregos, romanos e outros povos antigos e na Idade Média pelos senhores feudais.
CONTRADIÇÃO 11: “O conto do vigário” original — o plano
“Casa Própria no Além” oferecido pelos portugueses. O conto do vigário original
é a origem das promessas dos políticos em véspera de eleições.
Os jesuítas portugueses propuseram
aos indígenas uma troca:
1)
vocês abrem mão de todos os bens materiais que nós vamos levar dessa terra, ou
seja, o ouro, os diamantes, as esmeraldas, todo o pau-brasil e tudo o mais que
consideramos de valor, e das terras que nós vamos ocupar;
2)
vocês podem escolher; os que não quiserem serão escravizados ou exterminados. [Neste
instante o barbudo militar luso ali perto disparou o bacamarte e os índios,
boquiabertos, ficaram muito impressionados com a eficiência do pau-de-fogo, com
poder de destruição muito superior ao do arco e flecha local. Estava
instituído o temor a Deus.]
3)
em troca, Deus lhes dará uma moradia, paz e felicidade na vida eterna... no
paraíso, após a morte.
4) mas isto só se vocês
– amarem-no sobre todas as coisas e
obedecerem seus mandamentos;
– assumirem a culpa dos donos do mundo —que
somos nós, os invasores recém-chegados— pelos estragos que causaram ao mundo, e
pagarem essa culpa durante a vida com sofrimento, penitência, renúncia e
resignação;
– assumirem o pecado original, que vossas
mães lhes transmitiram ao copularem com vossos pais, assim transgredindo a
castidade da Virgem Maria;
– forem solidários com o sofrimento de
Cristo na crucificação. (Nota: no Estados Unidos, o fanatismo religioso
protestante que estimulou os colonizadores do Meio-Oeste por volta de 1700 tem
como antítese, no 3º Mundo, a religiosa resignação e autopiedade católicas dos
dominados.)
5) Se cumprirem à risca este contrato de fé, entrarão no Céu e ganharão sua moradia no Além.
Muito
tempo depois, ca. de 300 anos, o dono do mundo ainda acrescentou às concessões:
— Vivam ao máximo todos os sentimentos humanos, assim como nós lhes temos ensinado, pois é o que lhes é permitido. E podem também praticar muito esporte e exercícios físicos para conservarem a força de trabalho que devem dedicar a mim e a procriarem rebentos para substituí-los quando vocês envelhecerem.
A
oferta de um “Paraíso na vida eterna” em troca dos bens materiais, por ser o
primeiro em nossa terra, é o “conto do vigário” original que os portugueses
trouxeram para passar nos brasileiros —brasis, naquela época— e que as igrejas continuam passando em toda a
população.
Aquele
“conto do vigário” materializou também o primeiro “arrastão” no Brasil, pois os
portugueses recém-chegados, tendo em punho o bacamarte para atemorizar,
escravizar e exterminar os índios, raparam para a matriz o nosso ouro, diamantes,
esmeraldas, outros recursos minerais e o pau-brasil.
Uma
rapina que lembra a maioria dos contratos das empresas multinacionais com os
países do 3º Mundo, quando estas exigem que os
governos anfitriões, para terem a honra de hospedá-las, façam antes todos os
investimentos em infraestrutura nos lugares onde vão instalar-se: construam
cidades com moradias e comércio para os operários e suas famílias, e sistemas
completos de abastecimento, esgotamento e saneamento que vão, a bem da verdade,
servir às próprias indústrias, assim como os incentivos fiscais que exigem e os
empréstimos oficiais a juros reduzidos para a construção civil e instalação das
fábricas e capital de giro.
Como
o 3º Mundo não tem capital próprio, tem que contrair no mercado internacional
empréstimos a juros correntes para materializar tanta exigência. Os
países-anfitriões aumentam suas dívidas, os juros sobre as dívidas, e as
multinacionais aumentam seus patrimônios, seus lucros, e o país colonizador
prospera.
A Igreja Católica não fez por menos. Dissimulando
interesse pelos pobres e pelos povos, é a entidade mais esperta do Planeta,
muito mais do que qualquer banco, indústria, governante ou país colonizador. Sempre
ganhou, e continua ganhando, dos dois lados.
Nos
campos da Europa, desde que foi adotada por Roma como religião oficial, nas
terras que recebeu, tomou dos pobres tudo o que pôde nas roças de seus feudos,
explorando-os a taxas de arrendamento altíssimas; nas cidades e povoados, cobrando
deles emolumentos pelos serviços que presta, além do óbolo durante o culto:
missas, batizados, primeiras-comunhões, crismas, casamentos, enterros e o que
mais inventar.
Tomou muito dos ricos na Europa
medieval, vendendo-lhes ingressos para a vida eterna, as famosas indulgências.
Mas isto foi circunstancial, o que ela sempre tomou e continua tomando dos
ricos são os vultuosíssimos donativos que recebe de empresas e abastados para
exigir dos pobres, como doutrina, a renúncia aos bens terrenos, eliminando
assim a concorrência de bilhões de pessoas.
Ganhou dos reis e nobres muitos campos para explorar. Converteu todos os
povos que a ameaçaram com religiões diferentes. Sem disparar um único tiro, sem
investir um único tostão em exércitos ou armas —os reinos católicos deram-lhe o
necessário apoio militar bélico.
A estatueta de “Grande Espertalho” vai, sem dúvida, para a Igreja Católica Apostólica Romana!
CONTRADIÇÃO 12: os crimes e as tragédias do cotidiano são terríveis, mas rendem muito patrocínio para as emissoras de rádio e tv e todos os demais meios de comunicação. Isto porque o crédulo ser humano, sempre de boa fé, diante das tragédias sempre conclui que mais vale comprar logo o que se quer do que morrer com dinheiro guardado, porque ele foi induzido a pensar que “além de flores, nada mais vai no caixão”, quando, na verdade, a manutenção do poder se baseia precisamente no que o falecido não leva no caixão, isto é, seus bens, pois a ordem jurídica dominante manda que fiquem para seus sucessores.
CONTRADIÇÃO 13: o bem estar físico e psicológico e os sentimentos. Os sentimentos estão vinculados a momentos de bem estar, desejo sexual, paz, etc.; como os seres humanos vinculam tais momentos às pessoas que os proporcionaram, criam, na falta delas, a saudade de alguém. Da saudade de alguém nasce a falta da pessoa ausente, donde, no outro extremo da relação, nasce a dominação psicológica sobre o saudoso.
CONTRADIÇÃO 14: “Bandidos” e “Terroristas”. Bandidos são
pessoas geralmente sem posses herdadas que têm o pensamento livre e a
capacidade de empreender por conta própria mas não têm acesso aos caminhos de
ingresso e ascensão social na sociedade traçados pelos gestores da civilização.
Reconhecendo e temendo a sociedade oficial como entidade meramente repressora, aventuram-se a negócios com mercadorias e
serviços proibidos no código de conduta dominante, e a práticas também
proibidas pelo sistema jurídico que valida o código de conduta, com o
objetivo de transferir para si bens e/ou
mercadorias de terceiros com ou sem ameaça de armas, e por isso estão sempre
vigilantes e precisam organizar-se defensivamente para se precaverem e evitarem
os contra-ataques e os repressores e punitivos atos da polícia e das
autoridades públicas, quase sempre... e no caso específico, sempre
extorsionárias.
O
Governo Federal passou recentemente (aprox. 2010) a incentivar orgulhosamente o “empreendedorismo”, isto é, a capacidade que o ser humano tem —e muitos
demonstram-no na prática— de montar um negócio próprio. Esse incentivo oficial
ao empreendedorismo é o reconhecimento dos próprios dominantes quanto à
capacidade de empreender do ser humano.
Quando
o ser humano assume o risco de investir suas poupanças, transformando-as em
capital de giro a favor do PIB, passa a ser sócio nanominoritário dos donos do
mundo, que, como sócios teramajoritários, passam a atrelar e gerir o capital do
poupador, este ingênuo porque atraído por motes de “não tenha patrão” e “seja
dono do próprio nariz”. Com essa isca, o Estado evita ônus para si e também se
propicia receitas adicionais através da arrecadação de impostos.
Montar negócio próprio
ilegal é no entanto a única opção que muita gente não privilegiada por esta
civilização já há milênios é obrigada a adotar com a mera finalidade de
sobreviver nesta sociedade que, além de não suprir suas necessidades, ainda por
cima a marginaliza, preconceitua e criminaliza.
Essa gente são os chamados “bandidos”, que, montando negócios próprios para suprir suas necessidades pessoais e coletivas, são os legítimos pioneiros em contestar que o trabalho não-alienado seja privilégio dos donos do mundo.
Cada assassinato de policial significa que a causa da guerra civil ainda está em vigor (outubro 2021).
Os terroristas, embora
assim designados pelo Estado e seus patrocinadores, são de fato “organizações
guerrilheiras”. Sobre eles, a psicologia dominante chega a dizer que são
pessoas com traumas familiares, desprezadas e/ou maltratadas por suas famílias,
principalmente na infância. Assim, segundo as autoridades constituídas, os
bandidos seriam pessoas desprezadas e/ou maltratadas pela sociedade, e os
terroristas, por suas famílias.
Pois é precisamente o oposto. Bandidos e terroristas são pessoas sem quaisquer laços que os atrelem às instituições oficiais civis, militares e familiares, já que, por instinto de sobrevivência, têm que transgredir a sociedade que os condena e seus valores, e cedo na vida têm que superar a morbidez dos grilhões psíquicos e psicológicos da ideologia dominante que oprimem o ser humano comum, como o temor à morte, à prisão, a deus, ao pecado original, ao mea culpa, ao pagamento dos pecados da humanidade e outras hediondas fantasias cristocapitalósicas autoopressivas.
CONTRADIÇÃO
15: Desconfiança da autoridade pública em relação à população. O policial —aqui
representando a autoridade pública— pode desconfiar à vontade de uma pessoa, e
fazer o que puder para confirmar ou descartar tal desconfiança, mas o indivíduo
que, conhecedor do comportamento da Polícia, desconfiar das intenções de um
policial, é considerado elemento perigoso, mal intencionado, porque, segundo a
ideologia dominante, a Polícia, que tem fé pública, “sempre representa a
Verdade e a Justiça”. Um delegado ou policial pode empurrar um detido para
provocá-lo, para ver se ele está nervoso. Todo detido, de um modo geral, sempre
está nervoso, e se, por isso, ao ser empurrado ele reage aplicando um soco no
policial, este o considera um homem normal, mas perigoso. Porém, se ele refreia
essa reação instintiva, ou outra qualquer, é considerado, além de “perigoso”, “mal
intencionado”.
Desconfiança só pode
haver de cima para baixo; um inferior ou marginal, ou mesmo um cidadão pacato,
não pode desconfiar das autoridades públicas ou privadas superiores. A
desconfiança é privilégio das classes dominantes e seus prepostos. O ser humano
comum não tem direito de desconfiar de seus superiores hierárquicos.
O ser humano deve ser espontâneo diante da autoridade, deve reagir instintivamente sem conspirar.
CONTRADIÇÃO
16: A família. Seria o amor o "instinto de preservação da espécie e do
habitat" em si? O "instinto de sobrevivência" da espécie embutido
no indivíduo?
Terra
e ser humano se separaram, a propriedade coletiva passou a individual, a guerra
de sobrevivência entre tribos foi substituída pela concorrência individual no
mercado de trabalho, "o instinto de preservação da espécie" passou à
casa, ao cônjuge, aos filhos e aos pertences da "família", uma micro
ou nanotribo, ou, hoje, monotribo.
O
amor natural ocorre durante a atração sexual e dura uma paixão, e espera um
pouco mais se gera filhos. A obrigação de manter esse amor para sempre é dogma
de conduta religioso inventado para convencer o ser humano de que o amor eterno
por uma companheira é uma verdade biológica, e assim forçar os cônjuges a uma
união vitalícia.
Esse
amor ideológico, divulgado em vários formatos artísticos pelos meios de
comunicação, é composto de 4 nonos (4/9) de sabor e cinco nonos (5/9) de
dissabor, porque a massa do bolo, nesta civilização cristã, hoje capitalista, já
nasce desandada, empenada, favorecendo os que tinham terras, casas, mulheres,
filhos, rebanhos e escravos.
E por falar em rebanhos, há quem diga que os bois nasceram para churrasco, que já trariam essa funcionalidade no próprio DNA, e o indício disto é que o gado não foge quando o curral pega fogo.
O
amor do casamento é indissolúvel, um dogma de fé, uma norma de conduta criada
pelas religiões para convir à organização civil em casais.
A
obrigação de manter o amor a qualquer custo faz cada cônjuge culpar o outro
quando chega o fastio, e essa culpa impede a solidariedade em nome do afeto original
e dos filhos gerados.
A
família ideológica consiste de um ou dois pais (ing. e fr. parents), que deve ou devem despejar sua onipotência sobre os
filhos. A onipotência paterna é a realização de uma carência de afirmação
causada e fomentada, através de valores competitivos e individualistas, pela
ideologia dominante que acaba consagrando nos pais o poder de deuses em cada
micro ou nanouniverso.
Se pensarmos que todos os indivíduos engajados no sistema produtivo capitalista são portadores dessas todas e tantas carências, podemos visualizar que a reunião de todas essas pessoas ao fim do dia em um "lar" é o encontro de todas essas carências, individualizadas por posição hierárquica na casa, no estudo e no trabalho, pelo sexo de cada um, faixa etária, pelas capacidades, habilidades e necessidades de cada um, podemos afirmar que o momento doméstico, a sala de estar, não é de fato um encontro, mas um insuportável e irreversível desencontro, um conflito que cada familiar acaba indo tentar resolver fora dali buscando semelhantes onde estejam e quem sejam.
"Prótese pra que te quero"
Marilda é empregada da
Leste Rede Ferroviária, secretária do serviço de suporte aos maquinistas e
foguistas. Está bem situada, leva uma vida relativamente satisfeita, mas
gostaria de ter umas formas mais cheinhas, mais arredondadas nas nádegas, nos
seios e, para revitalizá-lo, no rosto.
Assim, submete-se a uma
cirurgia plástica e, satisfeitíssima, sente-se melhor, mais vaidosa, e o tempo
continua a passar.
Meses depois, em função
de ocupações convergentes, ela encontra
Strô, abreviação de Strogonofe, apelido de rua do seu namoradinho de
início de adolescência no bairro. Emocionados com o reencontro, reatam o antigo
namoro, e Strô acaba confidenciando a ela que, apesar dos seus modernizados
encantos, ele sente saudades daquela magrelinha de sua adolescência no Estácio.
Ela pensa durante
alguns dias; pensa, decide e responde: — Retiro meus enchimentos se você puser
uma prótese para aumentar seu pênis.
— Minha vez! — Ele
exclama. Conformado, mas satisfeito, concorda.
Duas semanas depois,
numa sala cirúrgica, Marilda está deitada numa cama. Está nua. Enquanto os
cirurgiões e assistentes traçam as linhas para remoção das próteses de
enchimento, outra turma, debruçada sobre sua vagina, com vários instrumentos de
medição nas mãos, enfia ali um paquimetro para anotar profundidade e diâmetro,
para adequar a ela a prótese do amado.
— A perfeição é a meta ! — informa-lhe o sorridente assistente. Ela sorri também.
Marx
disse:
"A família moderna contém, em germe, não apenas a escravidão (latim servitus) como também a servidão, pois, desde o começo, está relacionada com os serviços da agricultura, que era trabalho de uma família inteira. Encerra, em miniatura, todos os antagonismos que se desenvolvem, mais adiante, na sociedade e no Estado."
CONTRADIÇÃO 17. Os direitos adquiridos por cidadãos, associações, grupos , etc., garantidos ou não na Constituição de um país, só valem se o governo em vigor os tiver proposto ou, no mínimo, estiver de acordo, porque o direito e seus sujeitos, sendo o direito uma figura abstrata, não têm exércitos que lhes garantam vida permanente. São vulneráveis, frágeis, passíveis de destruição a qualquer momento pelos governos a eles antagônicos, como ocorreu recentemente no Brasil, de 2016 até 2022. Assim, o Estado de Direito, tão bravateado na República, é uma ficção insegura, extirpável a qualquer momento.